Betinha News #2

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Esse texto foi originalmente publicado no Facebook. O texto foi mantido para futura nostalgia, mas novos elementos e formatação interativa foram adicionados.

Olá, humanos. Eu sinceramente não esperava que um texto despretensioso sobre uma estrela chamaria tanta a atenção de vocês. Amei os comentários e agradecimentos, obrigado pelo carinho de todos, de verdade ♥. Por isso, eu decidi arriscar e falar mais sobre física. No texto passado eu falei sobre a Betinha, a estrelinha que, infelizmente, insiste em não morrer. Hoje, vamos entender um pouco mais sobre a nossa estrela chamada Sol, que felizmente não vai morrer tão cedo.

Ah, para quem não leu o primeiro texto, Betinha é uma estrela chamada Betelgeuse que tá apresentando um comportamento estranho em seu brilho nos últimos meses. Este comportamento provavelmente está relacionado com o fim de sua vida, mas não temos certeza, apenas estamos torcendo para que ela morra logo a fim de estudá-la e observá-la melhor.

Vamos começar com uma pergunta: quanto tempo você acha que a luz demora para sair do Sol e chegar até aqui na Terra? 8 minutos? Achou errado, otário. Quer dizer, você está parcialmente certo, só precisamos esclarecer de qual parte do Sol estamos nos referindo.

As partículas (mediadoras) de luz, conhecidas também como fótons, geradas no NÚCLEO DO SOL, levam aproximadamente 170 MIL ANOS para chegar na superfície terrestre. Por outro lado, como normalmente é divulgado, a luz da SUPERFÍCIE DO SOL demora cerca de 8 minutos. Vamos conferir essa última e depois entender a primeira afirmação.

Os maiores cientistas do mundo, ou seja, vocês, podem calcular o tempo que a luz leva da superfície do Sol até a Terra com apenas uma equação de cinemática e duas informações. Lembra daquela fórmula de velocidade média? Vm = ∆S/∆t? Velocidade média = Variação do deslocamento dividida pela Variação do tempo? Então, se a gente isolar a ∆t nesta equação, ou seja, ∆t = ∆S/Vm, podemos obter o tempo médio que algo em movimento leva para percorrer determinada distância. Se ficou confuso comenta ai que eu tento explicar melhor com minha letra feia.

Para descobrir o tempo, segundo essa equação, a gente também precisa da velocidade e da distância relacionadas ao movimento. A velocidade de propagação da luz, no vácuo, possui o valor constante de 299.792,458 metros por segundo (toda vez que você arredonda para 300 mil uma fada morre :’(). A distância média da SUPERFÍCIE DO SOL até a SUPERFÍCIE DA TERRA é de aproximadamente 149.597.870,700 metros (esse valor você pode arredondar para 150 milhões, as fadas agradecem :p).

Substituindo esses valores, a gente tem que a ∆t = 149.597.870,700 divido por 299.792,458 é um número grandão, então vamos considerar apenas as 5 primeiras casas decimais, portanto, o resultado é aproximadamente 499,00478 segundos. Agora só precisamos converter esse número de segundos para minutos. Para converter, basta dividir por 60, resultando em aproximadamente 8 minutos e 19 segundos. Um bom cientista checaria esse resultado…

Fato curioso: como as distâncias dos objetos presentes no universo são bem maiores comparadas às que estamos acostumados aqui na Terra, não é muito prático realizar cálculos utilizando unidades como “metros” e “quilômetros”. Entre objetos astronômicos presentes no nosso sistema solar, normalmente é utilizada a unidade conhecida como Unidade Astronômica, ou UA, que é uma constante com o valor composto pela distância média da superfície do Sol até a superfície da Terra (sim, a mesma distância que utilizamos = 149.597.870,700 metros).

Eu acho muito bacana conhecer esse raciocínio tão simples que explica algo tão importante em nossas vidas. Nosso cotidiano é repleto de afirmações científicas e raramente nos questionamos o “por quê?” de ser assim, mas é um hábito interessante de cultivar. E isso também nos mostra como a matemática pode ser incrível, com informações e relações simples a gente pode resolver vários tipos de problemas complexos e cheios de significados.

Vamos agora entender como a luz demora 170 MIL ANOS para percorrer o espaço entre o núcleo e a superfície do Sol. Dois principais fenômenos físicos ajudam a gente entender essa lentidão: o movimento browniano e o espalhamento Compton. Não foge ainda, por favor.

A densidade no núcleo do Sol é muito alta, isso quer dizer que há muita massa concentrada num volume relativamente pequeno (relativo porque o núcleo do Sol é grande pra caramba). Neste momento, não precisamos entender como nem quais partículas são geradas no núcleo solar, apenas aceitar que existem muitas partículas e de vários tipos, certo? Certo.

O desafio é que cada partícula de luz precisa passar por todas essas outras partículas até chegar na superfície. Vou apresentar um conceito para vocês chamado “Movimento Browniano”, parece difícil e estranho, mas é só estranho.

O Movimento Browniano pode ser definido como um movimento aleatório que as partículas manifestam em determinados meios, ou seja, é quando as partículas têm probabilidades iguais de se moverem em qualquer direção. Você também pode entendê-lo como “o andar de um bêbado”. A cada passo realizado por uma pessoa bêbada a probabilidade dela ir para qualquer direção é quase a mesma. Uma hora ela dá um passo para frente, outra hora para trás, depois vai para direita e a gente nunca sabe se ela vai cair.

Com a partícula acontece algo semelhante, ela varia a direção do seu movimento de forma aleatória, e nenhuma direção é privilegiada. Não vou explicar o motivo disso acontecer porque envolve conhecimentos mais complexos e levaria mais textão, mas deixo um GIF legal anexado no texto simulando o movimento browniano de uma partícula (neste momento, pause, analise o GIF e visualize o conceito).

Agora vamos entender um pouco sobre a física das partículas, mas só um pouco mesmo kkk. Existem 4 interações fundamentais na natureza (talvez você conheça como “força” em vez de “interação”, mas não gosto desse termo), sendo elas: interação nuclear forte, interação nuclear fraca, interação gravitacional e interação eletromagnética.

Cada uma tem uma série de propriedades e age de uma forma especial, mas não vamos aprofundar agora. É importante apenas entender que essas interações possuem partículas associadas que fazem o papel de “mediadoras”, ou seja, partículas responsáveis pela comunicação entre as interações e outras partículas.

Preciso que vocês acreditem em mim e assumam como verdadeiras essas duas afirmações: (a) que os fótons são partículas mediadoras da interação eletromagnética; e (b) quando um fóton e um elétron interagem, o fóton perde energia e a direção do seu movimento é alterada (esse fenômeno chama-se Espalhamento Compton).

OBS: Partículas de luz, que em outros momentos chamo de fótons, é algo fisicamente diferente da luz propriamente dita. Podemos, por enquanto, considerar a luz apenas como um tipo específico de radiação eletromagnética e o fóton como a partícula que compõe todas as radiações eletromagnéticas, e os fótons ainda são responsáveis pela mediação com a interação eletromagnética.

É aqui que tudo se encaixa (espero). Lembra que eu falei que a densidade do núcleo solar é altíssima e possui vários tipos de partículas? Então, isso significa que tem pouco espaço lá para os fótons se mexerem livremente, portanto, há uma grande chance de um fóton colidir com um elétron. Na verdade, algumas aproximações calculam que um fóton colide com um elétron a cada 0,1 milímetro, ou seja, basicamente o tempo todo! Por isso eu apresentei o conceito do Movimento Browniano, na prática acontece algo semelhante no núcleo solar.

Toda vez que um fóton do núcleo solar interage com um elétron, ele perde energia e muda sua direção. Isso significa que ele não faz uma trajetória em linha reta, mas que seu movimento é totalmente aleatório e ele pode mudar sua direção a cada interação, então ele pode estar quase chegando na superfície e simplesmente voltar para trás, a probabilidade é a mesma em cada colisão com o elétron.

É tipo nadar, nadar e não saber se você vai morrer na praia, sabe? É um comportamento aleatório que leva, em média, 170 MIL ANOS para o fóton percorrer toda a distância do núcleo até a superfície.

Agora, pare e reflita sobre as consequências do que acabamos de ver. A distância entre o núcleo e a superfície solar tem aproximadamente 696.000 quilômetros e a luz demora cerca de 170 MIL ANOS para concluir o percurso. Quando chega na superfície e inicia seu caminho até a Terra, que corresponde a aproximadamente 149.600.000 quilômetros de distância, a luz leva um pouco mais de 8 minutos. A partícula percorre uma distância mais de DUZENTAS VEZES MENOR em um tempo MILHARES DE VEZES MAIOR???????? Fale isso para seus amigos até eles falarem que você está endoidando, mas agora você consegue explicar minimamente essa doideira

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